30 de June de 2022
Continuando a nossa pequena “série” sobre o testamento e suas formas e requisitos ( sobre o testamento público, veja o aqui), falaremos agora sobre o testamento cerrado, ou conhecido também como testamento secreto.
Inicialmente, para efeitos introdutórios, porém sem nos delongar, passamos a explicar o termo “cerrado”, afinal, o que significa?
Cerrado é adjetivo e significa: vedado, fechado, porta cerrada, escuro, encerrado etc. segundo o Dicionário Online de Português.
Diferentemente do testamento público, o testamento cerrado é escrito pelo próprio testador, ou por outra pessoa, a seu rogo (a seu pedido), e por aquele assinado, será válido se aprovado pelo tabelião ou seu substituto legal, observadas algumas formalidades, nos termos do art. 1.868, do Código Civil.
As formalidades, são:
i) O testador deve entregar o seu escrito ao tabelião na presença de duas testemunhas (atente-se: o tabelião não escreve, conforme o testamento público, ele apenas recebe o que já foi escrito pelo próprio testador);
ii) Ao entregar o seu escrito ao tabelião, o testador deve declarar que aquele é o seu testamento e quer que seja aprovado;
iii) Após, que o tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas testemunhas, e o leia, em seguida, ao testador e testemunhas;
iv) O auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e pelo testador.
Quem leu a nossa publicação anterior já percebeu diferenças significativas quanto ao testamento público para com o cerrado.
Ou seja, o conteúdo de última vontade escrito no documento é secreto (por isso de ser conhecido como testamento cerrado), porquanto só o seu testador conhece, de fato, o conteúdo ali descrito.
Embora tenhamos visto que ao lavrar o auto de aprovação, o tabelião deve ler, para o testador e testemunhas, o artigo não se refere a leitura do testamento, senão não teria o nome de cerrado ou secreto. Nem as testemunhas sabem o conteúdo descrito pelo testador.
Logo, o que se lê é o auto de aprovação!
Tecnicamente o termo auto de aprovação é equivocado, conquanto que o tabelião não aprova nada, sequer as testemunhas.
Assim, quando se lê “auto de aprovação” a doutrina majoritária diz que é para entender como autenticação, pois ao tabelião não compete a sua “aprovação”, mas sim, limita-se a declarar a sua autenticidade.
Essa autenticação (termo de aprovação) é uma certidão que é levada a efeito no próprio testamento, ou seja, é uma certidão atestando que o testador elaborou o próprio testamento em termos mais simples.
Nesta forma de testamento há a possibilidade de ser elaborado em língua estrangeira (diferente do testamento público, que obrigatoriamente é em língua nacional). A ressalva que se faz é que, se for escrito em língua estrangeira, o testador obviamente deve entender o idioma.
Observação:
Se escrito em língua estrangeira, quando da abertura da sucessão, depois de aberto e registrado, o testamento precisa ser convertido para o português por meio de tradutor oficial.
Como vimos no início deste texto, o testamento cerrado pode ser escrito pelo próprio testador ou por outra pessoa a seu rogo, ou seja, a seu pedido.
Assim, o redator do testamento se limita a escrever o que determinado pelo testador, e este não precisa assinar.
É necessário que a assinatura seja do próprio testador (não necessariamente no de auto de aprovação, a exigência é que assine o testamento!), pois esta é exigência legal (art. 1.868, do Código Civil).
E mais que isso:
O testador não basta saber assinar, é essencial que saiba ler para poder conferir o que foi escrito pela pessoa que indicou (art. 1.872, do Código Civil).
Um detalhe importante:
é necessário que seja identificado e qualificado a pessoa que redigiu o testamento a pedido do testador, isto porque o redator, cônjuge, companheiro ou parentes não podem ser contemplados (art. 1.801, inciso I, do Código Civil).
Mas, e se o redator, cônjuge, companheiro e/ou parentes for (em) contemplado (s), o testamento cerrado será nulo?
A resposta inicialmente é não, uma vez que somente a cláusula que favorece estas pessoas será nula.
Entretanto, se não conseguir identificar o redator, defende-se a doutrina pela nulidade do testamento por falta de elemento essencial (identificação e qualificação do redator). Ressaltamos que essa questão sempre é objeto de discussão jurídica no caso cocreto!!
Depois de feito todo este procedimento, ao tabelião compete colocar o testamento em um envelope e simplesmente a costura, isso mesmo!
No entanto, o costume na prática leva o tabelião a colocar a cera quente e “carimba” com o seu “sinete” (uma forma de garantir a inviolabilidade), conforme imagem abaixo a título de exemplo:
Lacrado” pelo tabelião, é devolvido o testamento para o testador e, depois, registra em livro próprio a solenidade realizada, ou seja, somente fica no cartório o registro da solenidade e não o testamento, pois lembre-se: é um testamento secreto/cerrado!
Se o envelope for aberto ou violado, configura-se a revogação (art. 1.972, do Código Civil) e, consequentemente, sua nulidade caso seja levado à discussão, porquanto não possui mais valor.
Entretanto, caso não tenha sido o testador que o rompeu, e nem terceiros por ele autorizado, não resta comprometida a sua validade (será uma discussão jurídica interessante sobre esta parte final!).
É importante ressaltar que este tipo de testamento é muito “frágil” frente ao testamento público, por exemplo. Isto porque como o testamento não fica em cartório, somente o registro da solenidade, pode-se perder facilmente o documento lacrado e ninguém mais conseguir localizar o testamento.
Ademais, muito se discute a questão quanto ao conteúdo jurídico ali descrito. Muito das vezes o testador não conhece a lei e acaba, por exemplo, doando mais do que podia, ou seja, ferindo o direito à legítima. Nestas situações, apenas é nulo o que exceder a legítima, por exemplo, e não o testamento inteiro.
Cada caso é um caso…
Assim, com o falecimento do testador, o testamento deve ser apresentado ao juiz que, verificando inexistirem vícios externos, o abre, determina sua leitura, registra-se e ordena o seu cumprimento (art. 1.875, do Código Civil).
E se não for localizado o testamento, haja vista que somente haverá o registro público da solenidade no cartório, o que acontece?
Se não encontrar o testamento, se dará apenas à sucessão legítima, isto é, como se de fato não “existisse” qualquer testamento.
No próximo post sobre testamento, falaremos sobre a modalidade particular.